Demons
1.ª Parte
Impaciente descartou a boa educação. Apesar de sentir-se incomodada e de o seu sexto sentido a aconselhar a ir com muita calma, acendendo todas as luzes vermelhas e fazendo disparar todos os alarmes num raio de quilómetros, levantou-se, disposta a pôr termo naquela charada.
Mal abriu a boca... as palavras estudadas no breve interregno em que o seu interlocutor se deslocou até à janela e o pouco silêncio após o convite para um chá, que a enervou, não se articularam; havia-as escolhido uma a uma. E, sendo duas, ou três, poriam definitivamente termo ao que parecia estar a diverti-lo.
Inesperadamente ele encurtou a distância entre ambos e encarou-a de uma forma que nunca alguém o fizera. O olhar frio, quase dilacerante que lhe dirigiu, penetrou-a no mais profundo do ser; até o sentir como uma garra a esmagar-lhe a glote! Arrancando-lhe os segredos mais íntimos da alma.
— Compreendo! Chá não é o seu tipo. Prefere, café.
A voz dele soou-lhe metálica, raspada e grave! Como se procurasse controlar fúria e decepção. Mas era muito pior. Havia no tom e no soar, algo... inumano. Vazio de emoção, hostil. Longe da amabilidade e da leveza com que, talvez, quisesse pô-la à vontade quando entrou.
Intuiu ser melhor não proceder impulsiva, nem autoritariamente. Acabou por ensaiar uma desculpa não convincente, a engasgar-se e a balbuciar algo imperceptível; com a garganta a arder e ao respirar, doer-lhe o corpo inteiro! Literalmente como se a tivessem arrastado uma centena de metros pela mata mais inóspita do planeta.
— Per...doe-me. Não... quis... parecer-lhe... inde...li..cada.
Custou-lhe tanto dizer aquilo como estar de pé a discursar, durante três horas, sem molhar os lábios, nem beber uma gota de água, perante uma plateia que a interrompia questionando o peso de cada afirmação.
— Não! Não o faça. Partamos do princípio que, nem chá, nem café. E que a sua vontade de estar aqui é nenhuma, tal como lhe desinteressa por que motivo, está?! Visto que nem você, a sua mãe ou... o seu pai, poderão ter qualquer relação com este sítio.
— O... o meu pai?!
A maçaneta da porta rodou ruidosamente abrindo-a completamente para trás. No salão passaram a estar, quatro pessoas.
Continua...